Para Amatra, terceirização de atividade fim é um retrocesso e amplia trabalho escravo
02 de maio de 2015
Nos dias que antecederam ao 1º de Maio – Dia do Trabalho, um novo cenário no mercado de empregos começou a se redesenhar com a aprovação do Projeto de Lei 4330 – que amplia as formas de trabalho terceirizado no Brasil. Desde que o texto foi analisado pela Câmara dos Deputados, diversos atos e manifestações contra a medida têm sido promovidos para tentar barrar a medida. A Associação dos Magistrados Trabalhistas da Bahia (Amatra5) é uma das diversas associações de juízes do Trabalho no país que se posicionam contra o texto aprovado, por considerar que haverá um retrocesso nos direitos trabalhistas. Ao Bahia Notícias, a presidente da Amatra, juíza Andrea Presas, afirmou que o posicionamento da entidade é baseado no dia a dia dos magistrados. “A princípio, nós não somos contra a regulamentação da terceirização – que fique bem claro. Nós estamos nos manifestando contrariamente a esse projeto de lei da forma como ele está, porque esse projeto tem uma característica que é reconhecer a possibilidade de terceirização da atividade fim, e isso, na avaliação da magistratura trabalhista é um retrocesso”, diz.

“São décadas e décadas de uma construção jurisprudencial pelo Tribunal Superior do Trabalho [TST] estipulando, consolidando quais são as possibilidades em que é possível a terceirização e isso vem funcionando bem até hoje. Não que seja o ideal, mas é o que se construiu ao longo de décadas pela jurisprudencial do TST, que foi consolidado na Súmula 331”, contextualiza a magistrada.A Súmula 331 do TST reconhece que a terceirização é algo inevitável, mas estabelece como a terceirização pode ocorrer sem precarizar às relações trabalhistas. Andrea Presas afirma a grande preocupação dos magistrados com o texto do PL aprovado é os desdobramentos que ampliação da terceirização poderá ocasionar. Segundo ela, já é possível se conceber a ideia de uma empresa que não tenha um empregado sequer.

Andrea pontua que 40% dos processos que chegam ao TST envolvem relações de terceirizações e que, na primeira instância, o percentual pode ser ainda maior, pois há filtros para barrar o acesso de processos ao tribunal superior. “A preocupação é que muitas dessas empresas não têm patrimônio. E uma empresa que tem escritório, que consegue um contrato com a administração pública, muitas vezes, e está sobrevivendo daquele contrato. De ofício, o contrato chega ao seu fim, ou é rescindido pela empresa tomadora do serviço, e aquela empresa de terceirização não tem patrimônio para pagar os direitos trabalhistas de seus empregados”, explica dizendo que os magistrados se sentem frustrados com as diversas tentativas de execução. “Imagine se amanhã a gente permite uma ampliação dessa terceirização, para toda e qualquer atividade, onde é que a gente vai buscar meios para executar essas ações?”, questiona.

A presidente da associação rebate os argumentos de que a terceirização vai gerar mais postos de empregos. “Dados do Dieese apontam que a terceirização não vai gerar mais empregos, isso é uma falácia. O trabalhador terceirizado recebe salário 30% inferior ao salário do trabalhador contratado diretamente. Em relação a acidente de trabalho, 80% dos acidentes de trabalho que acontecem no Brasil, com mortes, envolvem terceirizados. São dados preocupantes. A rotatividade da mão-de-obra é maior com a terceirização. O trabalhador terceirizado permanece em torno de três anos a menos do que um empregado contratado”, rebate. A juíza diz que há um círculo vicioso no mercado de trabalho e na economia com a terceirização. “Se você vai gerar mais trabalho, você gera com menos renda, menos renda é menos consumo, e isso é ruim até para a iniciativa privada, porque não vai ter pra quem vender os produtos, pois a renda do trabalho reduziu. É um círculo vicioso que a terceirização gera”.

Para ela, os efeitos da terceirização serão sentidos em cinco/dez anos, e a situação será pior do que é hoje.Andrea Presas também diz que há uma forte relação entre terceirização e acidentes de trabalho por não haver investimento em qualificação do trabalhador, para se reduzir custos. “Quando eu qualifico menos, eu não dou o treinamento adequado, e assim, o trabalhador fica sujeito a sofrer mais acidentes. Com uma jornada maior de trabalho, o trabalhador também fica propenso a sofrer mais acidentes”, esclarece.

Ela cita que essa relação pode ser percebida com maior intensidade no setor de energia elétrica e petroleiro, que registra um número alto de acidentes de trabalhadores terceirizados. Infelizmente, segundo ela, o poder de atuação de magistrados, nesses casos, é muito incipiente. “Chega a nossa mesa o fato já consumado. Nós não podemos desfazer o acidente. Por mais ‘bonita’ que seja a sentença, por maior que seja a indenização, a vida que já foi ceifada, ou a saúde do trabalhador que ficou prejudicada”, conta. Outro problema que pode ser intensificado com a terceirização é a exploração de mão de obra análoga ao de escravo. “Propiciar uma terceirização sem limites, feita para toda e qualquer atividade, é possibilitar a ampliação do trabalho escravo no Brasil”, frisa.

Andrea diz que um projeto ideal de terceirização é o que está descrito na súmula do TST, que proíbe a terceirização da atividade-fim, que reconhece a responsabilidade solidária da tomadora de serviços, para ter de onde se cobrar os devidos recursos para pagar direitos trabalhistas. A Amatra, junto com a Associação Nacional dos Magistrados Trabalhistas (Anamatra), tem conversado com parlamentares, representantes do Ministério Público, da advocacia, com as bancadas representativas de cada estado, para tentar barrar o projeto - que segue para votação no Senado. Apesar de crer que o tema não prosperará, Andrea diz que a situação “é muito delicada”, pois, se for modificada pelos senadores, voltará para Câmara, que poderá manter o texto inicial aprovado. Também diz que, ainda que haja veto presidencial, a Câmara pode derrubar o veto.



Reportagem do site Bahia Notícias
MAIS LIDAS

enviar

ENDEREÇO

Rua Miguel Calmon, nº 285,
Edifício Góes Calmon, 11º andar,
CEP 40.015-901,S
Salvador - Bahia - Brasil

TELEFONE

Tel.: 71 3326-4878 / 3284-6970
Fax: 71 3242-0573

AMATRA5
Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 5ª Região
AMATRA5
© 2013 - AMATRA 5. Todos os Direitos Reservados
Agência NBZ - estratégia digital